História do Novo Sobrenome — Elena Ferrante

post originalmente de: 7/15/2023

Incrível como a Elena consegue sempre me surpreender. Meu primeiro contato com ela foi através de “A Filha Perdida”, e confesso que não dei muita atenção inicialmente. Mas decidi continuar lendo a autora, e não fazia ideia de como essa seria uma decisão maravilhosa (parabéns, Lívia do passado).

Em “A História de um Novo Sobrenome”, o segundo volume da série de quatro livros conhecida como Romances Napolitanos, somos levados ainda mais fundo na narrativa de Lenu sobre sua amizade com Lila. É uma história que te envolve completamente, deixando você ansioso para descobrir tudo sobre essas duas jovens napolitanas.

Esse livro tem um impacto enorme em mim, devido à escrita ABSURDA de Elena e à forma como ela nos faz entender a profundidade das dores de Lila e Lenu. Já aviso que é uma história repleta de sofrimento e momentos em que Lila, principalmente, luta por sua sobrevivência.

cena da série “A Amiga Genial” da HBO. (E é exatamente assim que me sinto)

Nessa obra, ambas as personagens rompem com sua infância e adentram a vida adulta, em um mundo hostil para ser mulher adulta. Em um trecho, podemos captar exatamente isso:

Tinham sido consumidas pelo corpo dos maridos, dos pais, dos irmãos, aos quais acabavam sempre se assemelhando, ou pelo cansaço ou pela chegada da velhice, pela doença. Quando essa transformação começava? com o trab. domestico? com a gestação? com os espancamentos?

Durante essa transição, conhecemos mais sobre a vida de Lenu e como ela se desenvolve, mas sempre em relação à sua amizade com Lila. Lenu se encontra em espaços diferentes do seu bairro, em ambientes mais cultos frequentados por pessoas que nasceram nesse meio. Ela é uma exceção, não pertence a esse mundo, e percebe isso claramente. Ela tenta se reinventar a todo custo, o que a leva a fazer reflexões sobre classe social, dinheiro e educação.

Além disso, personagens que já conhecíamos e que antes não desempenhavam um papel tão importante na narrativa passam a ganhar forma e se tornam essenciais para a vida das personagens.

TRECHOS QUE ME MARCARAM ~PODE CONTER SPOILER

as frases, gritadas assim na garganta, no peito, mas sem explodir no ar, são como estilhaços de ferro cortante a lhe ferir os pulmões e a faringe

experimentei o horror e o prazer de me perder

Havia algo perverso na desigualdade, e agora eu compreendia. Algo que agia em profundidade, que escavava além do dinheiro. Não bastava o caixa das duas charcutarias nem o da fábrica de calçados ou da loja de sapatos para ocultar nossa origem.

Tudo nela seria fruto da desordem das ocasiões.

Habituada como eu era a ausência de privilégios, aquele privilegio inesperado me deu energia

Havia uma parte de mim que estava cansada de agir sempre como uma pessoa de bom senso.

Hoje sinto certo mal-estar ao relembrar o quanto sofria, não tenho nenhuma empatia por quem eu era naquela época

Odiava sobretudo a mim mesma, me desprezava

De repente me dei conta daquele quase (…)

Eu sempre teria medo: medo de dizer a frase errada, de usar um tom excessivo, de estar vestida inadequadamente, de revelar sentimentos mesquinhos, de não ter pensamentos interessantes.

Nem os momentos de prazer resistiam a um exame rigoroso?